Luiza
Esta é uma história verídica. Conheci Luiza no “Talavera Bruce”,
um dos estabelecimentos penais para ré educandas do Rio de Janeiro. Íamos em
grupos nos diversos pavilhões cumprir nossa tarefa de levar o conhecimento do Evangelho
às detentas. Três pessoas em cada setor, porque elas têm necessidade de falar e
gostam de falar e serem ouvidas; uma forma de desabafar o sofrimento.
Luiza se destacava.
Gritava, gritava para todos que era inocente, que não matara Rosinha.
“Imagine, logo a Rosinha que era meu anjo pequenino!” E, dirigindo-se
ao nosso grupo, mãos postas para o Céu, exclamava:
- “Fala, Rosinha, eu te matei? Se o Espírito não morre, se nós
voltamos, como dizem os espíritas, fala para eles, Rosinha, que eu não te
matei! Você sabe que não, Rosinha!”
E chorava, chorava horas seguidas sem parar.
Sua história é uma história
de amor. Luiza vivia só, com pequena pensão deixada pelo seu pai. Não pensou em
se casar. Um dia achou que poderia criar uma criança pobre. E encontrou uma
cheia de feridas, pele e osso, às portas da morte, parecendo uma boneca de
lixo...
Apanhou-a, tratou-a, deu-lhe tudo de bom: alimentação,
tratamento médico, educação, religião também. Considerava-se a mais feliz das
criaturas. Tudo dando certo. Na escola, Rosinha fez o primário, dando à Luiza o
orgulho de qualquer mãe.
Mas... Quando Rosinha foi
para o ginásio, a convivência com outras meninas que não tiveram educação tão
primorosa, ela alterou o caráter e começou a imitar os maus comportamentos. É a
fase da imitação que ocorre com muitos colegiais. Pena é que quase sempre, no
mau sentido...
Luiza notou e iniciou a
fase de conselhos, mostrando os erros e observando que iriam prejudicar a
menina mais tarde. Rosinha se modificava dia a dia. Parecia outra. Chegava em
casa tarde. “Estava com a turma!”
Uma noite, Rosinha não
voltou para casa. Pela manhã, olhos inchados de tanto chorar, Luiza olhou
tristemente a cama vazia. Abriu a porta da rua e deparou com o corpo de
Rosinha, morta na varanda. Foi incriminada. E condenada.
Por isso Luiza na cadeia era uma desesperada. Gritava inocência.
Eram tão insuportáveis os seus gritos que chegou a ser internada na “cela surda”,
onde sofria horrivelmente.
Nunca mais vi Luiza.
Passaram-se cinco anos. Um dia, meu marido e eu estávamos veraneando numa praia
das baixada Santista, quando de repente, vi uma moça sentada na areia que se
parecia com Luiza. Aproximei-me. Reconheci-a. Ela também me reconheceu. E
exultou de alegria. “Que bom vê-la de novo!” – Disse.
- Conte-me, Luiza, como foi a sua vida, com tanto sofrimento?
- “estou feliz! Aquela
casa ali é nossa. Depois iremos lá.”
- “Nossa... De quem, Luiza?”
-“Meu marido e eu e aquelas três menininhas que estão brincando
na areia. Elas têm dois, três e cinco anos.
Nós as adotamos. Estavam num casebre; os pais morreram numa
enchente...”
Fiquei perplexa. Depois
de sofrer tanto por ter adotado uma menina, agora adotara mais três. Luiza
acrescentou:
“Lá na prisão, conheci um
advogado solteirão, cansado de farras. Só pensava em largar tudo para
descansar.
Casamos, somos felizes e adotamos aquelas três.
E Luiza recordou os
encontros da Instituição Espírita Cooperadoras do Bem Amélia Boudet. “As aulas
de Espiritismo mostraram novos caminhos para minha vida. Foi só segui-los”.
Disse ainda que, era a “cabeça dos motins” na penitenciaria. Depois, era a que
impedia as reeducadas de promoverem arruaça.
Claro que os nomes dos
personagens desta história são fictícios. Mas os fatos são verdadeiros. São
resultantes da ação abnegada dos expositores da Doutrina Espírita com o amparo,
sempre generoso, da Espiritualidade.
Idalina A.
Mattos ( Extraído do SEI – 1078/1988)
Fonte:
Jornal A caridade de Junho de 1996
Imagem:
Marco A. C. Neves
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