A violência nossa de cada dia
Parecia o
retorno dos gladiadores dos circos de Roma!… O que era para ser mera diversão
transformou-se em cenas de selvageria jamais vista nem mesmo no mundo animal:
ferir por ferir… Até mesmo os patrocinadores se horrorizaram e fecharam a torneira
dos milhões de reais!
Na Turquia,
as autoridades tomaram uma atitude sui generis para contrapor as ondas
de violência das torcidas nos estádios de futebol: proibir a entrada de homens
e só admitir a entrada de mulheres e crianças…
Mas a
violência explode infrene como se fosse uma praga espalhando os miasmas
pestilenciais por toda a Terra! E, nos tumultuados dias hodiernos, ela deixou
de ser apanágio dos adultos, vez que as crianças, recebendo com a mamadeira a
visão dos quadros de desequilíbrio através das mídias, bebem, com o leite, as
informações deletérias de mentes apodrecidas. A violência está presente até nos
desenhos animados. Assim os pequenos e futuros rambos vão assimilando em
seus psiquismos esses ingredientes sórdidos, cujo corolário é a explosão da
violência de variegado matiz nos proscênios sociais… Os noticiários
surpreendem-nos dia a dia com as informações desses despautérios, num
interminável desfile de horrores…
Os Espíritos
Superiores não ficam insensíveis ante esses quadros desoladores e, vez por
outra, enviam-nos, à guisa de orientações e estímulos as suas palavras
esclarecedoras. Assim, temos uma belíssima e oportuna página de Camilo1,
o guia Espiritual do médium fluminense Raul Teixeira, na qual o Benfeitor
Espiritual tece, com os fios de sua sensibilidade, preciosas ilações sobre
essas candentes questões do nosso cotidiano com o sugestivo título2:
Jesus
ante o temor da violência
Reforçada
por uma cruel propaganda massiva, a violência vai ganhando espaço no
mundo psicológico das pessoas, passando a envenenar suas expressões emocionais,
impondo-lhes temores que, no passar do tempo, se vão convertendo em francos
processos neuróticos.
As mídias
vão infestando de pavor as grandes quanto as pequenas cidades, aterrando homens
e mulheres de procedências sociais diversas, uma vez que a hidra da violência
não escolhe as suas presas, vergastando com seu látego covarde o dorso de toda
a Humanidade.
São
tempos difíceis e definidores, esses tempos atuais. São oportunidades para que
as almas encarnadas na Terra possa escolher de que lado anelam ficar, se na
luz, se nas sombras; se anseiam pelos altos cimos espirituais, ainda que com
esforços inauditos, ou se preferem a aridez dos apetites baixos que infernizam os
indivíduos de má vontade.
Em todo
lugar onde se instalaram os quartéis-generais da violência, em guetos de
sordidez, perante o comodismo e mesmo a complacência de autoridades
constituídas para proteger as populações, e diante da inépcia dos processos educacionais
de má qualidade, não são
poucos os
que se armam de diversas formas, a fim, dizem, de protegerem-se e
proteger seus familiares e pertences.
Imprevidente
iniciativa essa, a de armar-se o indivíduo, objetivando defender-se, pois, para
defender-se com qualquer arma, terá que investir contra outra pessoa,
realizando a justiça que não lhe cabe efetuar.
(…)
Disse o
Celeste Amigo que não deveríamos temer os que podem matar o corpo, mas que nada
podem fazer contra a alma.3(…)
Não se
trata de prestar culto ao holocausto, nem de promover um estado coletivo de
masoquismo religioso, para demonstrar desapego ao corpo. Não, não se
trata disso. A questão é mais profunda; é mais séria.
(…)
Nessas
considerações sobre o temor da violência, vale, ainda, recordar outro
ensinamento do Homem de Nazaré, ao dizer4: “Aquele que quiser ganhar
a vida, perdê-la-á, e o que a perder, por amor de mim, ganhá-la-á”(…).
Essa
dificuldade de entendimento das pessoas, com respeito ao “querer ganhar a
vida” e quanto ao “perdê-la”, deve-se ao compreensível instinto de
conservação que faz com que ninguém queira se desfazer do corpo, ainda que
esteja enfrentando problemas graves ou situações complexas, salvo nos casos de descompensação
psicológica profunda ou de alguma anomalia psiquiátrica.
Desejam “ganhar”
suas vidas, na acepção do Evangelho de Jesus, os que não trepidam em destruir
as dos outros, para preservar a própria. Após o esfriamento da mente, quando o
criminoso homicida se der conta do que promoveu com o seu gesto insano, as
perturbações do remorso passarão a acompanhá-lo, como a “voz da consciência” a
imputar-lhe culpa.
(…)
É por
isso que quem quiser ganhá-la, “perdê-la-á”. Sim, porque perde-se a alegria
de viver, as motivações para uma existência sóbria e bela desaparecem,
pois a sombra da culpa acompanhará o desditoso réu, à semelhança da “voz
da consciência” que cobrava de Caim o haver morto seu irmão (…).
(…)
Quando
queremos penetrar o sentido do ensinamento do Cristo a respeito do ganhar e do
perder a vida, faz-se importante tomar outro ângulo para percebermos que serão
felizes os que estejam “ganhando” espiritualmente as próprias existências,
convertendo-as em vida, pelas realizações fecundas, pelo crescimento que
imprimam às próprias ações, pela fidelidade com que sirvam a Deus, em cada
gesto que os caracterize pelo mundo. Esses serão bem-aventurados, recolhendo
das Fontes Celestiais, em forma de bênçãos de saúde íntima, de equilíbrio
geral e de paz, a vida abundante que souberam buscar, ao longo dos seus dias na
escola terrena.
Quanto
aos que venham a perder as suas vidas, e, aqui, nos referimos tão-somente aos
que levam a vida com nobreza, realizando seus deveres, na marcha e nas lutas
naturais na busca do Criador, sendo golpeados pelas explosões de violências,
caso não se percam na revolta e no desejo enlouquecido de vindita, avançam para
a Grande Luz, deixando para trás as necessárias e duras experiências num mundo
expiatório.
(…)
À frente
das ações e modos violentos das criaturas do Seu tempo, o Mestre Jesus jamais
deixou de chamar a atenção dos Discípulos para a sua inconveniência.
O exemplo
do Rabi é de molde a incutir em cada um de nós, que fazemos parte do Seu
rebanho de almas, as noções de que o mundo carece de harmonia e não de
violência; de alegria e não de desolação; de paz e não de guerra.
Frente às
mídias que se locupletam com as notícias violentas, que “vendem”, tanto quanto
infelicitam, a criatura com mente arejada pelos ensinos do Espiritismo, que a
todo tempo confirmam os de Jesus, aprenderá a trabalhar os valores da alma, a
atuar de modo consciente e digno na vida terrena, sem se deixar arrastar, nem
arrasar, pelos impulsos da violência, que degeneram, que ferem, que matam.
Dia chegará
em que, amadurecidos, os homens se unirão como irmãos verdadeiros, encontrando
a violência somente nos compêndios, nas enciclopédias de história, que
revelarão um tempo tormentoso vivido pela Humanidade, e que, então, estará bem
distante do mundo venturoso da Nova
Era.
___________________________
[1] – TEIXEIRA, Raul. Justiça e Amor. Niterói:
Fráter, 1996, cap. VI, item 3. (in fine).
2 – TEIXEIRA, Raul. Justiça e Amor. Niterói:
Fráter, 1996, cap. VI, item 4.
3 – Mateus, 10:28.
4 – Mateus, 16:25.
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