Há
provas científicas da existência dos Espíritos?
Parte
I
por Marcos Villas-Bôas
Os últimos textos, como
primeiros do blog, tinham o objetivo de despertar a curiosidade sobre o estudo
científico dos Espíritos e tratar de alguns pontos básicos. Muitos têm cobrado
agora a apresentação de provas científicas da existência de Espíritos. Alguns
elementos já foram apresentados em texto anterior, mas iremos, de agora em
diante, descer em mais detalhes sobre sólidos estudos realizados por célebres
cientistas ao longo da história.
Primeiramente, é preciso
tecer algumas palavras sobre a prova e sobre a prova científica. Uma prova é um
relato sobre um fato, é algo que atesta a ocorrência do evento ou a procedência
de uma teoria e lhe faz, assim, fato, consumado, aceito. A prova, portanto, é,
como tudo na vida social, comunicacional e retórica.
Quer-se dizer com isso que
não existe a “prova em si”, mas apenas a “prova aceita”. Há prova quando há
concordância sobre algo estar provado.
A prova científica se
forma, então, quando há concordância de estudiosos acerca de um relato ou de
uma teoria sobre algo, e essa “certeza” depois termina “escoando” para a
sociedade. É, portanto, um conceito fluido, na medida em que não há uma
definição de quantas pessoas seriam necessárias para se falar em “prova
científica”. É preciso unanimidade? Seria maioria? Se sim, simples ou absoluta?
Pretende-se demonstrar com
isso que há um claro e considerável grau de subjetividade em relação ao que
está provado cientificamente e ao que não está. A imensa maioria das pessoas
não faz experimentos científicos, nem viu com os próprios olhos as provas de
99,99% deles. Elas simplesmente acreditam, pois veem especialistas falando
sobre aquilo, beneficiam-se de tecnologias resultantes das descobertas e sua
racionalidade aceita a hipótese.
Quantos já fizeram
experiências científicas com a energia elétrica? A partir de qual momento foi
possível afirmar que havia prova da sua existência? Apesar de Tales de Mileto
tê-la descoberto na Grécia Antiga, se alguém afirmasse isso no século XIII,
seria queimado na fogueira como demoníaco. Se falasse no início do século XVII,
seria tido por louco.
Foi apenas em meados do
século XVII, 23 séculos depois de Tales de Mileto, que se iniciaram estudos
sistematizados da energia elétrica com Otto von Guericke. No século XVIII
vieram Ewald Georg von Kleist, Petrus van Musschenbroek, Benjamin Franklin,
Luigi Aloisio Galvani e outros. No século XIX, vieram James Clark Maxwell,
Heinrich Hertz, Thomas Alva Edson e outros. Em 1876, próximo do final do século
XIX, ainda não se sabia transmitir a energia elétrica gerada.
Qual a importância disso
para o estudo dos Espíritos? Ninguém vê propriamente a energia elétrica, mas
apenas os efeitos que provoca, sendo possível senti-la. Até o início do século
XVIII, mesmo apesar dos estudos de alguns dos cientistas geniais aqui citados,
a grande maioria das pessoas negava existir a energia elétrica. Algo similar
acontece com os Espíritos, que, em regra, não se mostram aos olhos da maioria
dos humanos. Segundo Kardec, no item 105 do Livro dos Médiuns:
“Por sua natureza e em seu
estado normal, o perispírito é invisível e tem isto de comum com uma imensidade
de fluidos que sabemos existir, sem que, entretanto, jamais os tenhamos visto.
Mas, também, do mesmo modo que alguns desses fluidos, pode ele sofrer
modificações que o tornem perceptível à vista, quer por meio de uma espécie de
condensação, quer por meio de uma mudança na disposição de suas moléculas.
Aparece-nos então sob uma forma vaporosa”.
O estudo do Espírito
enquanto objeto científico começou apenas em meados do século XIX, com Allan
Kardec. Quem lê suas obras nota a sua rara racionalidade e capacidade
científica, mas é preciso, como sempre, desenvolver e difundir a ciência que
ele sistematizou.
A sociedade em geral
apenas aceitará a existência dos Espíritos na medida em que possa ter mais
elementos concretos, o que é complicado, pois eles são seres inteligentes em
corpos semimateriais, de modo que, primeiramente, o estudo dessa ciência
depende de uma aquiescência dos próprios Espíritos, que são gente como a gente,
em participar das experiências.
Os experimentos Scole dão
provas robustas da existência de Espíritos, pois registraram em áudio, fotos e
vídeo a desmaterialização e rematerialização de objetos, comunicações
espirituais, toques deles nos pesquisadores por meio de uma mão visível e
palpável etc.
Como de costume, alega-se
que pode haver embuste nesses experimentos. Há pessoas que poderiam se deparar
com o Espírito de um ente querido, se comunicar claramente com ele e, mesmo
assim, não acreditariam que aquilo tivesse realmente ocorrido. Não adianta querer
fazer enxergar aquele que não quer ver. Recorre-se com frequência à
justificativa do sonho e das alucinações para afastar qualquer possibilidade
espiritual.
No caso dos que estão
abertos a entender os Espíritos, eles são inteligências fora do corpo físico,
ou seja, são nós mesmos, humanos, desencarnados, não havendo o que temer, mas
apenas respeitar e compreender. É preciso, no entanto, um forte senso crítico
para que a aceitação da existência dos Espíritos, ou para que a afinidade com a
Ciência Espírita, não leve a conclusões precipitadas.
Carl Gustav Jung, o pai da
Psicologia Analítica, passou toda sua vida lidando com experiências mediúnicas
de sua mãe e dele próprio, porém nunca afirmou existir prova científica da
existência dos Espíritos.
Com receio de ser execrado
do meio científico, uma vez que já tinha sofrido retaliações de Freud e outros
por se interessar pelo Ocultismo, ele era muito cauteloso e não afirmou
abertamente que tinha contatos com o mundo espiritual até a sua última
brilhante obra, escrita quando já tinha mais de 80 anos de idade. Nela, ele
afirma:
“Não foram somente os meus
sonhos mas, ocasionalmente, os de outras pessoas que, revisando ou confirmando
os meus, deram forma às minhas concepções a respeito de uma sobrevida”
(Memórias, Sonhos e Segredos, p. 40).
Jung cita ao longo desse
livro inúmeros casos de premonições dele e de outras pessoas, encontros com
Espíritos durante o desprendimento da alma ao longo do sono, com coincidências
incríveis e que, de tão incríveis, o levaram a concluir que aquilo não era
simplesmente ação da sua imaginação.
Como todo bom cientista,
Jung procurava se questionar bastante sobre todos os sonhos e visões que tinha.
O mesmo acontecia com Camille Flammarion. Em texto anterior publicado aqui no
blog, um leitor deixou comentário sobre o fato de o próprio astrônomo ter
afirmado que as cartas escritas por ele e assinadas como “Galileu” não foram
eventos mediúnicos em comunicação com Galileu Galilei, mas apenas sonhos,
elementos da sua imaginação:
“Naquelas reuniões na
Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, escrevi, por meu lado, páginas sobre
astronomia assinadas por ‘Galileu’. Essas comunicações ficavam no escritório da
sociedade, e Allan Kardec publicou-as em 1867, sob o título Uranographie
générale (Uranograjia Geral), em seu livro intitulado Genese (Gênese) (do qual
conservei um dos primeiros exemplares, com a dedicatória do autor). Essas
páginas sobre astronomia nada me ensinaram. Não tardei em concluir que elas
eram apenas o eco daquilo que eu sabia e que Galileu nada tinha a ver com
aquilo. Era como uma espécie de sonho acordado. Além disso minha mão parava
quando eu pensava em outros assuntos” (As forças naturais desconhecidas, p.
44).
Cabe aqui uma
importantíssima observação destinada a todos, mas especialmente aos que já são
espíritas fervorosos. Assim como acontece no debate político, tendemos a
aceitar aquilo que nos agrada e a refutar aquilo que nos desagrada. Se queremos
realmente aprender mais e nos aprofundar em algum tema, é preciso questionar
cada fato, cada premissa e cada conclusão. Do contrário, o risco de erros é
enorme e, no caso da Ciência Espírita, o risco de misticismo também.
Quanto à afirmação acima
de Flammarion, contudo, pode ser que ele mesmo tenha ficado confuso e chegado a
uma conclusão errada. De qualquer forma, mesmo que ele houvesse sonhado e não
tivesse psicografado Galileu, ou mesmo que ele não fosse, como alguns propõem a
reencarnação de Galileu, que buscava o conhecimento no seu inconsciente, isso
em nada ruminaria a existência de Espíritos e da psicografia, como o mesmo
Flammarion afirma tantas vezes no próprio livro:
“Mas, nada é mais raro, no
nosso planeta, que a independência e a liberdade absoluta da mente; nada é mais
raro, também, que a verdadeira curiosidade científica, desprovida de qualquer
interesse pessoal. Os leitores, em geral, dirão: ‘O que há nisso de tão
importante? Mesas que se elevam, móveis que se mexem, poltronas que se
deslocam, pianos que saltam, cortinas que se agitam, pancadas dadas sem causa
conhecida, respostas a questões mentais, frases ditadas ao contrário, aparições
de mãos, de cabeças ou de fantasmas, tudo isso não passa de banalidades ou de
bobagens indignas de ocupar a atenção de um cientista. E o que isso provaria,
se fosse verdade? Isso não nos interessa’. Há pessoas incapazes de se abalarem,
mesmo que o céu lhes caia sobre a cabeça. Eu responderei: Mas como? Nada
significa saber, constatar, reconhecer, que existem forças desconhecidas ao
nosso redor?” (As forças naturais desconhecidas, p. 9-10).
Flammarion demonstra, a
todo o tempo, nesse livro o cientista brilhante e curioso que era, sempre
aberto a descobertas, a infirmar suas próprias “verdades”, mas também
questionador, desconfiado. Essa deve ser a postura de um estudioso, de alguém
ávido por aprender mais e mais. À frente, ele diz o seguinte:
“De um lado, os
céticos não abrem mão de suas objeções, convencidos de que eles conhecem todas
as forças da natureza, que todos os médiuns são farsantes e que os
experimentadores não sabem observar. Por outro lado, os espíritas crédulos que
imaginam haver constantemente espíritos à sua disposição em uma mesinha redonda
e evocam, sem pestanejar, Platão, Zoroastro, Jesus Cristo, Santo Agostinho,
Carlos Magno, Shakespeare, Newton ou Napoleão, eles irão me lapidar pela décima
vez, declarando que me vendi ao Instituto por uma ambição inveterada, e que não
ouso concluir em favor da identidade dos espíritos, para não contrariar os
amigos ilustres” (As forças naturais desconhecidas, p. 10-11).
Essa obra de Flammarion
aqui citada é de 1906, mas foi uma revisão de texto publicado no ano de 1865, o
que é muito interessante, pois, quarenta anos após o jovem cientista escrever
sobre o assunto, ele volta a analisar aqueles fenômenos espirituais muito mais
maduro e após adquirir bem mais conhecimento. A sua importância histórica
também é evidente. Um trecho transcrito da primeira obra diz o seguinte:
“É preciso ser bem
audacioso para insistir, em nome da própria ciência positiva, em afirmar a
possibilidade dos fatos chamados (erroneamente) de sobrenaturais, e de se fazer
o campeão de uma causa aparentemente absurda, ridícula e perigosa, sabendo-se
que os partidários confessos dessa causa têm pouca autoridade na ciência, e que
seus partidários ilustres não ousam declarar que o são tão abertamente.
Todavia, já que essa causa acaba de ser tratada momentaneamente por uma
infinidade de jornalistas, cujas preocupações habituais são bem diferentes dos
estudos das forças da natureza; como, de toda essa massa de escritores, a maior
parte só fez acumular erros sobre erros, puerilidades sobre extravagâncias, e
como fica evidente em cada uma de suas páginas (que eles me perdoem essa
confissão!) que não somente eles não conhecem os rudimentos do assunto que
pensaram poder tratar de acordo com sua fantasia, mas que também seu julgamento
sobre essa ordem de fatos não repousa em nenhuma base, eu penso que seria útil
deixar desta longa discussão um documento mais fundamentado, e enfrento
voluntariamente mil críticas, por amor à verdade” (As forças naturais
desconhecidas, p. 13).
Como se nota, muito pouco
mudou. O tema dos Espíritos era tratado do final do século XIX para o início do
século XX pela maioria como fantástico e de forma fantasiosa. Uns queriam negar
a todo custo e outros queriam acreditar a todo custo. Os famosos que
acreditavam buscavam, muitas vezes, não aparecer, com receio dos preconceitos
de pessoas que os criticavam duramente sem nada saber das manifestações.
Como Flammarion as vinha
pesquisando havia alguns anos, rebatia-os com certa indignação:
“É bom que se saiba que
não considero meu julgamento superior ao dos meus colegas, dos quais alguns
têm, em outros assuntos, um alto valor. É simplesmente porque, não estando
familiarizados com o assunto, eles se perdem a torto e a direito, errando em
uma região desconhecida, confundindo até os próprios termos e considerando como
impossíveis fatos constatados há muito tempo, ao passo que este que escreve
estas páginas vem fazendo experiências e discutindo o assunto já há muitos anos”
(As forças naturais desconhecidas, p. 13-14).
Não é nenhuma novidade a
desconfiança humana em relação ao que é novo, sobretudo ao que desmente suas
crenças, mais especialmente ainda se disser respeito a suas crenças mais
íntimas sobre quem ele é e sobre como o mundo a sua volta funciona. Flammarion
nos remete, então, de volta à descoberta da eletricidade:
“Em 1791, um italiano, em
Bolonha, tendo pendurado na balaustrada de sua janela rãs esfoladas, com as
quais havia preparado um caldo para sua jovem esposa doente, viu-as se mexerem
automaticamente, embora elas tivessem sido mortas na véspera. O fato era
inacreditável e, por isso, Galvani encontrava uma oposição unânime por parte
daqueles a quem contava o fato. Os homens sensatos pensavam que se rebaixariam
caso se dessem ao trabalho de verificá-lo, tanto que estavam certos de sua
impossibilidade. Todavia, Galvani chegara a notar que o efeito máximo se
produzia quando se colocava um arco metálico de estanho e cobre em comunicação
com os nervos lombares e a extremidade das patas da rã. Então, ela entrava em
convulsões violentas. Ele pensou tratar-se do fluido nervoso e perdeu o fruto
de suas descobertas. Ele estava reservado a Volta, ao descobrir a eletricidade”
(As forças naturais desconhecidas, p. 17).
Os Espíritos fazem
analogias frequentes entre a eletricidade, o magnetismo e fenômenos
espirituais. Trata-se, em todos os casos, de fluidos ainda pouco conhecidos
pelo homem, sobretudo na última situação. Assim como levou muitas décadas para
a eletricidade ser aceita como descoberta científica e é difícil dizer em qual
momento exato se teria uma prova científica dela, o estudo dos Espíritos está
em processo de maturação, carecendo de curiosidade e cautela de todos que lidem
com ele.
Os excelentes livros de Jung
e Flammarion citados aqui buscam entender cientificamente as manifestações
espirituais e merecem, com certeza, ser lidos por todos. Em textos seguintes,
continuaremos a analisá-los, juntamente com obras de outros estudiosos tão ou
mais célebres do que eles, procurando uma resposta para a pergunta: há prova
científica da existência dos Espíritos?
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