A
LIBERDADE DO PERDÃO
João Carvalho Neto
Muito se fala sobre a necessidade do perdão dentro
das concepções filosóficas cristãs, contudo, também se reconhece a dificuldade
em exercê-lo, talvez porque ele nos venha sendo imposto como uma obrigação e
não construído através de uma verdadeira convicção.
Em minhas atividades profissionais tenho podido
constatar como a sua falta limita as possibilidades de vida dos seres humanos,
isso porque conflitos não resolvidos passam a ser referencial para a observação
de novos conflitos, fazendo com que eles se tornem
potencializados. Ou seja, se você não se libertou de
um conflito no passado, recente ou remoto, a chance de resolver
satisfatoriamente novos conflitos se torna significativamente menor, pois a
reação não elaborada quanto ao primeiro evento passa a alimentar reações cada
vez mais fortes diante dos eventos subsequentes.
Afirmo com isso que, se você ainda guarda raiva
contra alguém de algo passado, diante de um fato novo com outra pessoa que
possivelmente não seria tão significativo, você tenderá a potencializar o fato
novo com as emoções reprimidas do passado.
Talvez por isso Jesus tenha dito: “Concerta-te sem
demoras com o teu adversário, enquanto estás a caminho com ele, para que não
suceda que ele te entregue ao juiz, e que o juiz te entregue ao seu ministro, e
sejas mandado para a cadeia. Em verdade te digo que não sairás de lá, enquanto
não pagares o último ceitil”. (MT, V: 25-26)
Esta passagem tem sido interpretada na nossa visão
“taliônica” da Lei de Causa e Efeito como: se eu errar contra alguém vou ser
punido, situação que hoje não me parece tão objetiva e direta assim. Prefiro
então interpretar essa passagem de Jesus como se você não perdoar aquele que te
ofendeu tua percepção das situações futuras ficará prisioneira deste fato
anterior, de tal forma que não veremos o presente tal qual ele é, mas como
nosso olhar tendencioso pelos rancores passados vai enquadrá-lo.
Aliás, em passagem muito pertinente a esta
interpretação, Emmanuel, no livro “Pão Nosso” afirma: “As situações externas
serão retratadas em teu plano interior, segundo o material de reflexão que
acolhes na consciência.” Tenho percebido também que, do ponto de vista
energético, durante um conflito fabricamos matéria mental que fica registrada
no éter cósmico, em uma memória cósmica, a que os orientais chamam de Registros
Akáshicos. Pois esses registros são um sistema de energia sustentado pelas
emoções das partes envolvidas no conflito, mas que passa a retroalimentar essas
mesmas partes, de tal forma de que enquanto o sistema não for dissolvido pelo
perdão, energeticamente essas pessoas permanecem presas àquela memória,
exigindo reencontros encarnatórios sucessivos até que a matéria mental ali fixada
seja diluída para a libertação final.
Vejamos, então, como a falta do perdão nos aprisiona
a modelos de reações e às pessoas. Na verdade o que nos leva a reagir
agressivamente contra alguém, ativamente ou de forma reprimida, é a convicção
na culpa patológica que, religiosamente nos foi introjetada em correlação com o
castigo. Ou seja: quem é culpado merece ser castigado, uma convicção plenamente
humana e nunca divina.
Por nos acreditarmos culpados é que tendemos a
atribuir culpas exacerbadas nos outros, vivenciando a necessidade de
castigá-los, ativamente ou em pensamentos reprimidos.
Temos dificuldades em nos percebermos alunos na
escola da vida, passíveis de erros uns contra os outros nos exercícios que ela
nos propõe e, portanto, necessitados de tolerância com nossos próprios erros e
com os dos demais. Quando nos damos conta de que o outro que nos feriu o fez
porque era o que podia fazer diante de sua compreensão limitada da vida, de que
ele erra porque não sabia fazer melhor, e que, muitas vezes se não em todas ele é um agente do nosso próprio aprendizado,
ficaria muito mais fácil perdoá-lo e, até mesmo, agradecer-lhe a oportunidade
de realizarmos nosso crescimento.
Por tudo isso, perdoar é um imenso exercício de
libertação, nos possibilitando sermos realmente gratos a Deus por toda e
qualquer experiência com que nos confrontamos, vivenciando uma paz que o mundo
das competições, dos orgulhos e das honras ainda não conhece.
João Carvalho Neto
Psicanalista, autor dos livros: “Psicanálise da
alma” e “Casos de um divã transpessoal”. www.joaocarvalho.com.br
João Carvalho Neto participará do VII CONGRESSO
RAMATIS DO BRASIL.
Imagem:
http://www.frasesparaface.com.br/frases-perdao/
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