1. INTRODUÇÃO
O objetivo
deste estudo é mostrar a contribuição que o Espiritismo pode oferecer aos
homens públicos, no sentido de auxiliar-lhes a tomada de decisões. Para o fim
proposto, faremos um resumo histórico das doutrinas políticas e analisaremos os
problemas da ação política sob a ótica espírita.
2. CONCEITO DE POLÍTICA
2.1. SIGNIFICADO DE POLÍTICA
Derivativo
do grego politikós (polis), que significa tudo o que se refere à cidade,
portanto, citadino, público, social.
Na Idade
Moderna o termo perdeu o seu significado original tendo sido substituído por
expressões tais como “ciência do Estado”, ciência política”, “doutrina do
Estado” e “Filosofia Política”.
“O conceito
de Política, entendido como forma de atividade ou de praxe humana, está
intimamente ligado com o de poder. O poder foi definido tradicionalmente como
algo que se “se baseia nos meios para obter uma vantagem” (Hobbes) ou
analogamente como “o conjunto de meios que permitem obter efeitos desejados”
(Russel). Um destes meios é o domínio sobre os outros homens”. (Bobbio, 1988,
p. 21-36)
2.2. NATUREZA POLÍTICA
A Política
é, em certo sentido, a tomada de decisões através de meios públicos, em contraste
com a tomada de decisões pessoais, adotadas particularmente pelo indivíduo, e
com as decisões econômicas, geradas como resposta a influências impessoais,
tais como o dinheiro, condições do mercado e escassez de recursos. Platão e
Aristóteles fazem uma analogia com o “navio” para explicar a ação política. O
timoneiro deveria cuidar do leme, do peso, da rota e dos tripulantes para que o
mesmo não encalhe, não afunde e chegue ao seu destino. O mesmo se dá com o
governante à frente de um Estado, isto é, deve conduzir homens aos ideais
propostos.
Observe que
o Third New International Dictionary, de Webster, menciona que a palavra
“govern” vem do frances antigo governer, derivada do latim gubernare (guiar,
pilotar, governar) que por sua vez vem do grego kybernan. (Deutsch, 1988, p.
15-20)
2.3. NECESSIDADE DA POLÍTICA
A política
não é apenas uma atividade das instituições sociais, senão que se origina na
própria essência da sociedade, independentemente de sua institucionalização. O
bem comum, por sua vez, é a concepção milenar da função da Política dentro da
sociedade, e a expressão clássica desta concepção está em Santo Tomás de
Aquino, que, na sua Suma Teológica, escreve “Finis politica est urbanum bonum”
— “A finalidade da política é o bem comum”. Não é religioso ou filosófico, mas
social. (Franco, 1988, p. 9-14)
Mas que é
esse bem comum?
Quem melhor
o definiu foi o Papa João XXIII, nos seguintes dizeres: “O Bem comum consiste
no conjunto de todas as condições da vida social que consintam e favoreçam o
desenvolvimento integral da personalidade humana”.
3. RESUMO HISTÓRICO
3.1. ANTIGÜIDADE
Nas Antigas
civilizações orientais não houve
verdadeira doutrina política; os grandes impérios asiáticos e o Egito não
admitiam que aí pudesse haver forma de governo diferente da monarquia absoluta,
exercida em nome do deus protetor da Nação. O que existia era a arte de
governar, transmitida pelos reis aos seus escolhidos. Os escritos do Taoísmo,
na China, servem como exemplo, quando diziam que governar é como fritar peixes
pequeninos. (Mosca, 1987, cap. IV)
A origem da
Política como doutrina e forma de governo está relacionada com as idéias
desenvolvidas por Platão (427-344 a. C.) e Aristóteles (384-322 a. C.). Platão
descreve no livro República o estado ideal e indica as causas da decadência que
fazem com que da cidade ideal, possa-se gradualmente chagar à tirania, isto é,
à pior das formas de governo. Aristóteles começa por afirmar que o homem é um
animal naturalmente social. Segundo ele, os dons que a natureza deus aos
indivíduos só podem desabrochar através do contato social. (Mosca, 1987, cap.
VII)
3.2. IDADE MÉDIA
Período que
vai de 476 (queda do Império Romano) até 1453 (tomada de Constantinopla pelos
turcos). “A principal característica da Idade Média, do ponto de vista
político, é a confusão do direito privado e do direito público, do que resulta
a que o proprietário ou o possuidor de um trato de terra acreditava-se
investido de direitos soberanos sobre os habitantes dessa região”. (Mosca,
1987, p. 74)
No campo
intelectual havia ausência de espírito crítico e de senso histórico,
inexistência do espírito de observação e respeito excessivo ao princípio de
autoridade (Bíblia e Aristóteles). A ruptura desse modelo de pensamento
político se dá com o aparecimento da obra de Maquiavel, o Príncipe, onde diz o
que é a realidade (mostrando as falcatruas dos dirigentes) e não como ela
deveria ser. (Mosca, cap. XI)
3.3. IDADE MODERNA E
CONTEMPORÂNEA
Período que
se estende de 1453 aos nossos dias. A Idade Moderna representa a transição do
Feudalismo ao Capitalismo Industrial. A instituição do Parlamentarismo na
Inglaterra, a Revolução Francesa, o aparecimento do nacionalismo e do
imperialismo são alguns dentre os muitos aspectos que caracterizam essa fase.
Atualmente
nota-se uma tendência à democracia na maioria dos países liberais. “Na pesquisa
sobre liberdade no mundo de 1992, a organização Freedom House, de Nova Iorque,
verificou que, pela primeira vez na História, a maioria dos países da Terra são
democráticos. Das 171 nações pesquisadas, 89 eram democracias declaradas e 32
se encontravam em transição para a democracia”. (Jornal do Brasil, 1992)
4. AÇÃO POLÍTICA
4.1. TEORIA E PRÁXIS
A questão da
relação entre a Teoria e a Práxis, que por assim dizer foi fundada por Platão;
foi ele talvez quem primeiro teve a consciência do problema. A questão aparece
em Platão no livro A República, e justamente no famoso Livro VII da República,
que é o livro em que existe uma famosa alegoria, o chamado “Mito da Caverna”.
Ele propõe a seguinte questão: como podemos fundar a relação entre governantes
e governados? Existe uma relação de obediência. Como justificar essa
obediência? Onde encontrar elementos teóricos para legitimar uma relação de
obediência?
Na alegoria
do “Mito da Caverna”, Platão coloca alguns homens numa caverna, de costas para
a entrada, de modo que só conseguem ver as próprias sombras projetadas no fundo
da mesma. Dentre esses homens, um deles (o filósofo) se vira e sai à procura da
luz (conhecimento). Inteira-se dele e por, dever de consciência, obriga-se a
passá-lo aos demais que lá ficaram. Acontece que se ele disser a verdade, será
ridicularizado. Portanto, para evitar esse contratempo, cria o “mito”, a fim de
que seja ouvido e obedecido. O filósofo, que é amante da verdade, tem de mentir
e transforma-se mais em rei do que filósofo. A relação entre o real e o ideal é
um problema por resolver e Platão joga-o para os séculos seguintes. (Ferraz,
1988, p. 39-48)
4.2. FILOSOFIA E POLÍTICA
MARXISTA
Tanto os
pensadores da Antigüidade quanto do da Idade Média davam ênfase ao Estado ideal
e não ao Estado real. Karl Marx (1818-1883), filósofo materialista e criador do
materialismo histórico diz que até aquela época os filósofos idealizaram o
mundo, mas que chegara o momento de transformá-lo através da ação.
Como
procedeu Marx? Estudou a dialética idealista de Hegel (1770-1831) e a dialética
materialista de Feuerbach (1775-1833). Observou a luta de classes na Inglaterra
e o processo da Revolução Francesa. As conclusões levaram-no a criar o termo
materialismo histórico, ou seja, a matéria é origem de tudo e o modo de
produção é que determina a religião, a arte, a forma familiar etc.
O
materialismo histórico ou dialético pode ser resumido da seguinte forma: a luta
de classes — escravos lutando contra os senhores numa sociedade escravagista
levaria esta à sociedade feudalista; a luta dos vassalos contra os senhores
feudais, levaria esta sociedade ao capitalismo; o proletariado, nesta
sociedade, lutando contra os capitalistas levaria ao comunismo. O comunismo
seria uma sociedade igualitária, onde não haveria a exploração do homem pelo
homem. Em termos práticos, vimos a instituição do comunismo na Rússia e na
China, países pré-capitalistas.
5. AÇÃO POLÍTICA E ESPIRITISMO
5.1. MUDANÇA COMPORTAMENTAL
Na alegoria
do “Mito da Caverna”, Platão não consegue fazer com que o filósofo mudasse o
comportamento dos homens que ficaram dentro da caverna. No Espiritismo, Kardec
descortina-nos vários horizontes para a mudança do nosso comportamento, pois os
ensinamentos contidos em O Livro dos Espíritos e O Evangelho Segundo o
Espiritismo são um convite constante à melhoria de nossa conduta.
Hábitos
calcados nos automatismos negativos são estimulados a se transformarem em
atitudes centradas na moral evangélica.
5.2. TESE MARXISTA E ESPIRITISMO
5.2.1. LUTA DE CLASSES
O enfoque
marxista da ação humana “induziria” o povo a pegar nas armas para conseguir uma
situação mais igualitária da renda. No Espiritismo, vemos que a sociedade
caminha para uma situação de maior igualdade de riqueza, quando trata dessa
questão não pela “luta de classes”, mas por “classes de luta”, isto é, cada um
dentro de sua classe tenta suplantar a si mesmo e auxiliar o próximo.
5.2.2. A FELICIDADE
“Para os
marxistas a felicidade se encontra nos produtos materiais do trabalho da Terra,
enquanto para os espíritas, além dos proventos da Terra, o trabalho proporciona
também os de evolução espiritual. Por isso não basta dar trabalho ao homem,
sendo também necessário dar-lhe educação moral, ou seja, orientação espiritual
para que ele possa tirar do trabalho todos os proventos que este lhe possa
dar”. (Kardec, 1995, p.267)
5.3. RIQUEZA E PODER
A maioria de
nós gosta de possuir muitos bens e ter domínio sobre os demais homens. Mas de
acordo com as instruções dos Espíritos “A autoridade, da mesma forma que a
fortuna, é uma delegação da qual serão pedidas contas àquele que dela se acha
investido; não creiais que lhe seja dada para lhe proporcionar o vão prazer de
comandar, nem, assim como crêem falsamente a maioria dos poderosos da Terra,
como um direito, uma propriedade”. (Kardec, 1984, p. 229) Deus as dá como prova
ou missão e as retira quando lhe apraz.
5.4. ARISTOCRACIA
INTELECTO-MORAL
As
sociedades em tempo algum prescindem de chefes para se organizarem. Daí a
necessidade da autoridade. Esta autoridade vem se modificando ao longo do
tempo. No início tínhamos a força bruta, depois a do exército. Na idade Média,
a autoridade de Nascença. Segue-se-lhe a influência do dinheiro e da
inteligência, na época atual. Será o fim? Não. Segundo Allan Kardec, em Obras
Póstumas, há que se implantar a aristocracia intelecto-moral.
Aristocracia,
vem do grego aristos, melhor, e kratos, poder. Poder dos melhores. Quando isso
efetivamente se der, os homens que detêm o poder saberão que estão investidos
de uma missão e que serão cobrados pelo bom ou mal uso que fizerem de tal
mister.
6. CONCLUSÃO
Os
princípios codificados por Allan Kardec nos auxiliarão eficazmente nas
resoluções de ordem política, porque substituirá os impulsos antigos
automatizados no egoísmo pelos novos que serão automatizados na fraternidade
universal, dando uma nova força à inteligência, porque a “moral do Cristo”,
indicará o rumo certo que a inteligência deverá seguir, quando o nosso planeta
adquirir o equilíbrio entre o fator moral e o intelectual.
Acreditamos
que os governantes, quando a moral for o fator mais importante em todas as
resoluções, não mais irão buscar os seus interesses mesquinhos, mas, acima de
tudo, deverão aplicar amplamente a noção de “bem comum” propiciando sob todos
os meios possíveis a felicidade da maioria.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BOBBIO, N. O Significado da Política. In O Que é
Política. Curso: A Necessidade da Política I. Brasília, Instituto Tancredo
Neves, 1988.
DEUTSCH, K. A Natureza da Política. In O Que é Política.
Curso: A Necessidade da Política I. Brasília, Instituto Tancredo Neves, 1988.
FERRAZ JR. T. S. Política e Ciência Política. In O Que é
Política. Curso: A Necessidade da Política I. Brasília, Instituto Tancredo
Neves, 1988.
FRANCO, A. A. de M. A Necessidade da Política. In O Que é
Política. Curso: A Necessidade da Política I. Brasília, Instituto Tancredo
Neves, 1988.
Jornal do Brasil, 27/02/92
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed.,
São Paulo, IDE, 1984.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. São Paulo, FEESP, 1972
KARDEC, A. Obras Póstumas. 15. ed., Rio de Janeiro, FEB,
1975.
MOSCA, G. História das Doutrinas Políticas - Desde a
Antigüidade, completada por Gaston Bouthoul...; trad. de Marco Aurélio de Moura
Bastos. 6. ed., Rio de Janeiro, Guanabara, 1987.
São Paulo, dezembro de 1989
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