O Verdadeiro Sentido da Educação
N. Sri Ram
A
educação deve fazer parte do processo da expansão da vida, que sempre começa de
dentro. A criança é maleável e ainda não possui o nível de auto percepção dos
adultos; por isso, é extremamente importante que qualquer ensinamento seja
oferecido de maneira agradável, sem violentar seu crescimento natural.
Esse
esforço começa no nascimento da pessoa, se não antes. Devemos ter em mente que
o fenômeno da expansão começa com uma natureza que não é condicionada nem
autoconsciente, e portanto é extremamente maleável. Ela pode facilmente ser
afetada não apenas por ações que tenham o propósito de influenciá-la, mas
também por influências sutis.
Embora o
ambiente tenha grande importância, o mais importante para a criança são as
pessoas mais próximas a ela. Mesmo que no ambiente haja muito sofrimento, se a
influência dessas pessoas for do tipo certo, até mesmo o sofrimento em torno
pode ser um meio de evocar na criança sentimentos de compaixão e simpatia.
A
compreensão de que certas coisas não são agradáveis, que elas deviam ser
diferentes ou não deviam existir, produz uma mudança na consciência e faz
brotar a vontade e a capacidade de modificá-las. Portanto, o instrutor deve ser
uma pessoa que possua conhecimento amplo e cuja natureza, incluindo seus
pensamentos e emoções, seja útil à criança a cada momento. Podemos tentar
entender como um instrutor deve ser, e procurar pessoas que se aproximem desse
perfil.
O
ambiente para o crescimento da criança deve ser o melhor possível para esse
propósito. O objetivo deve ser extrair de cada uma delas suas melhores
qualidades e capacidades. Esse é o significado da palavra educação.
Se tudo o
que houver de bom numa criança for fortalecido tanto quanto possível nos seus
primeiros anos de vida, ela poderá mais tarde partir para o mundo, onde as
influências estão muito misturadas, e enfrentar o que quer que seja com a sua
força já desenvolvida.
Em
educação, parece haver uma teoria segundo a qual a criança deveria ser deixada
completamente livre para fazer o que quiser e aprender com as experiências. Mas
não deveríamos dizer às crianças que não mergulhem em águas profundas sem saber
nadar, ou que fujam de uma cobra venenosa? Deve-se dar às crianças o benefício
das experiências de outras pessoas. Se em nome da liberdade a criança fosse
deixada vagando pelas ruas e aprendendo por si mesma, não desenvolveria a
capacidade de se proteger e de manter a sua liberdade.
Qual deve
ser a principal característica da educação nos primeiros anos de vida?
Obviamente, a influência que cerca um novo ser – novo para todos os propósitos
práticos – deve ser estimulante e salutar. A creche, a sala de aula e o lar
devem ser coloridos, não “anêmicos” ou indefinidos. Deve-se cercar a criança
com coisas que propiciem o desenvolvimento da sua inteligência, sua capacidade
de afeto e tudo o que há de melhor em sua natureza.
Não pode
haver nada mais proveitoso para qualquer ser humano do que as influências da
natureza, as árvores, as flores, a água corrente, etc. A criança tem um
interesse natural por qualquer coisa viva, como as plantas e os animais.
Não sei
se todos nós compreendemos o quanto o medo, na educação, é um fator inibidor e
prejudicial. Mesmo que haja algo a ser corrigido na criança, o melhor método é
explicar e convencê-la de que tal coisa é indesejável. O processo de
crescimento é um processo de trazer para fora o que está dentro: suas
qualidades inatas, seu gênio, seu talento. Isso só é possível numa atmosfera de
liberdade. O instrutor deve se adaptar ao crescimento da criança, encarando os
processos desse crescimento como pontos onde o auxílio, a instrução ou a
orientação são necessários.
A criança
tem uma natureza tripla: a natureza do corpo, das emoções e da mente. Ela se
relaciona com tudo à sua volta nesses três níveis. Cada um desses aspectos
precisa ser auxiliado para se expandir de um modo natural, sem distorção.
Nos
primeiros anos de vida, talvez o crescimento e o controle do corpo requeiram
mais atenção. Não é preciso dizer que a criança deve ser alimentada
apropriadamente e que o corpo não deve ser negligenciado. O domínio do corpo
físico, seu perfeito ajustamento e sua utilização de maneira graciosa e naturalmente
expressiva o tornarão um instrumento apropriado para ser usado espiritualmente.
Deve-se ajudar a criança a atingir uma certa medida de autocontrole, a
coordenar seus movimentos, a usar adequadamente suas pernas e braços e a
aprender boas maneiras.
A criança
precisa aprender, desde os primeiros anos de vida, a se manter limpa. Depois
deve haver um treinamento dos sentidos, incluindo as cores e os sons. Uma das
maneiras de entrar em contato com a vida na natureza é ouvir os seus sons.
Os
sentidos são as janelas da alma. Quando seu alcance aumenta, toda a superfície
de contato com a vida também é aumentada. O pensamento e a formação de imagens,
que é parte do nosso pensar, baseiam-se nas impressões dos sentidos. A
imaginação não acontece no vácuo; ela é estimulada por nossas reações.
A
apreciação das artes e a prática de uma arte específica para a qual a criança
tenha aptidão deve ser parte do programa educacional. Esta é, com certeza, uma
maneira de refinar e educar as emoções.
As
emoções e sentimentos têm um papel mais vital que o corpo físico ou o
intelecto. Até mesmo a saúde depende, em grande parte, da condição emocional da
pessoa. Mas nossa educação não dá qualquer atenção a isso, e baseia-se quase
exclusivamente no cultivo da mente. Se pudermos estimular a capacidade de
afeição e simpatia da criança para com os outros, estaremos dando um impulso à
sua evolução.
Uma
criança deve, desde os primeiros anos, aprender a ter consideração para com os
outros em todos os contextos. Além disso, a educação deve preparar o indivíduo
para continuar aprendendo pelo resto da vida.
Qual a
finalidade da vida? Talvez seja mais vida, com a crescente compreensão de suas
potencialidades e do poder de criar, de modo que possa fluir cada vez mais
livremente e criar segundo a própria vontade. Deve-se ajudar as pessoas a
atingir o mais alto grau de inteligência possível e a serem livres para fazer
uso dessa inteligência; então, em sua liberdade, elas poderão fazer o que
desejarem. Educar deveria significar “abrir avenidas” nos cérebros e corações
dos jovens, avenidas que se alargarão e os levarão em frente em um processo de
aprendizado incessante, através de uma corrente de reação construtiva do
ambiente para a alma e da alma para o ambiente.
A alma do
homem é imortal e seu futuro é o futuro de algo cujo crescimento e esplendor
não tem limites. Por isso, a educação no sentido verdadeiro deve ser a educação
do corpo, da mente e das emoções, de tal maneira que juntos formem um
instrumento para a expressão da alma e a realização do seu propósito.
Verdades fundamentais
A mente
deve ser cuidadosamente treinada para desenvolver suas capacidades, e não ser
abarrotada com coisas desnecessárias. O importante é desenvolver uma mente que
não apenas imite, que seja capaz de agir por si própria e que tente aprender e
descobrir as coisas por si mesma, enquanto faz uso do conhecimento dos outros.
A mente, como um sensível aparelho de rádio, deve ser capaz de captar as coisas
e mantê-las em foco com clareza, percebendo suas implicações e indo além das
irrelevâncias em direção à realidade dos fatos.
Uma
educação realmente completa deve fornecer à criança os fundamentos de todos os
ramos importantes do conhecimento, mas isso deve ser feito sem sobrecarregar
sua mente com detalhes. Nós entulhamos nosso cérebro com muitas coisas
desnecessárias. Se eliminássemos tudo isso e descobríssemos o que é realmente
útil para o indivíduo, o que é essencial saber e o que representa um bom
conhecimento do mundo, estaríamos oferecendo uma educação de real valor para a
criança.
A tudo
isso eu juntaria o ensino de certas verdades fundamentais, como a noção de vida
una; o fato de que o homem não é apenas um corpo, mas que usa o corpo; a ideia
de que nós criamos nosso próprio destino; e até mesmo a reencarnação e o carma.
Tudo isso deve ser apresentado não como um dogma, mas como uma visão de vida,
de maneira plausível e razoável.
Uma ideia
importante a ser enfatizada desde o início é a de realizar todo trabalho, por
menor que possa parecer, tão bem quanto possível.
Muitas
crianças têm em si grandes possibilidades que algumas vezes não desabrocham;
elas possuem talentos ocultos para os quais não há escopo em suas vidas. Por
isso, quando alguém recebe a tarefa de educar uma criança, não deve pensar que
é uma tarefa insignificante. Essa visão é completamente equivocada, porque se
ajudarmos a criança a se desenvolver da melhor maneira possível, ela crescerá e
fará muitas coisas boas. Com o auxílio que damos aos outros podemos estar
ajudando ao mundo de maneira ampla, muito mais do que podemos entender.
Apenas os
melhores homens e mulheres deveriam ser escolhidos como educadores. Não
necessariamente os melhores do ponto de vista acadêmico. Muito frequentemente
aqueles que obtêm uma graduação o fazem através da super concentração em um
determinado assunto, o que, em muitos casos, resulta numa perspectiva estreita
e algo desequilibrada. Nem sempre os eruditos são os melhores para desempenhar
certas tarefas, como lidar com pessoas.
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