Perseguições
Revista
Espírita, setembro de 1862
Tendo a zombaria se
enfraquecido contra a couraça do Espiritismo, e servindo mais para propagá-lo
do que para desacreditá-lo, seus inimigos tentam um outro meio que, nós o
dizemos antecipadamente, não triunfará melhor e, provavelmente, fará ainda mais
prosélitos; esse meio é a perseguição. Dizemos que lhe fará mais, por uma razão
muito simples, é que tomando o Espiritismo a sério, com isto ele cresce
enormemente de importância; e depois, liga-se tanto mais a uma causa quanto ela
mais fez sofrer. Sem dúvida, lembra-se das belas comunicações que foram dadas
sobre os mártires do Espiritismo, e que publicamos na Revista Espírita do mês
de abril último. Esta fase estava anunciada há muito tempo pelos Espíritos:
"Quando ver-se-á,
disseram, a arma do ridículo impotente, tentar-se-á a da perseguição; não
haverá mais mártires sangrentos, mas muitos terão de sofrer em seus interesses
e em suas aflições; procurar-se-á desunir as famílias, reduzir os adeptos pela
fome, aborrecê-los a golpes de alfinetes, às vezes, mais pungentes do que a
morte; mas ali ainda encontrarão almas sólidas e fervorosas que saberão
desafiar as misérias deste mundo, em vista do futuro melhor que as espera.
Lembrai-vos das palavras do divino Salvador: "Bem-aventurados os aflitos,
porque serão consolados." Tranquilizai-vos, no entanto; a era da
perseguição, na qual logo entrareis, será de curta duração, e vossos inimigos
dela não retirarão senão a vergonha, porque as armas que apontarão para vós se
voltarão contra eles."
A era predita começou;
assinalam-nos de diferentes lados atos que se lamenta serem feitos pelos
ministros de um Deus de paz e de caridade. Não falaremos das violências feitas
à consciência expulsando da Igreja aqueles que ali conduz o Espiritismo; tendo
esse meio tido resultados quase negativos, procuraram outros mais eficazes;
poderíamos citar localidades onde as pessoas que vivem de seu trabalho foram
ameaçadas de se ver arrebatar seus recursos; outras onde os adeptos foram
assinalados à animosidade pública fazendo correr contra eles os moleques da
rua; outras em que despedem da escola as crianças cujos pais se ocupam do
Espiritismo; uma outra em que um pobre professor, primário foi destituído e
reduzido à miséria, porque tinha em sua casa O Livro dos Espíritos. Temos deste
último uma tocante prece em versos, onde respiram os mais nobres sentimentos, a
piedade mais sincera; acrescentamos que um Espírita benfazejo estendeu-lhe mão
segura; acrescentamos ainda que foi nessa circunstância vítima de uma infame
traição por parte de um homem em quem tinha confiado, e que pareceu
entusiasmado com esse livro.
Em pequena cidade onde o
Espiritismo conta com um número bastante grande de partidários, um missionário
disse do púlpito, nesta última quaresma: "Espero muito que no auditório
não haja senão fiéis, e que não haja nem judeus, nem protestantes, nem
Espíritas." Parece que ele contava muito pouco com sua palavra para
converter aqueles que tivessem vindo ouvi-lo com o objetivo de se esclarecer.
Em um município, perto de Bordeaux, quiseram impedir os Espíritas de se
reunirem em mais de cinco, sob o pretexto de que a lei a isso se opunha; mas uma
autoridade superior levou a autoridade local à legalidade. Resultou desse
pequeno vexame que hoje os três quartos deste município são Espíritas. No
departamento de Tarn-et-Garonne, os Espíritas de várias localidades querendo se
reunir, foram assinalados como conspirando contra o governo. Esta acusação
ridícula caiu bem depressa, como deveria ser, e dela se riu.
Como contra, nos foi
citado um magistrado que disse: "Praza a Deus que todo o mundo fosse
Espírita! nossos tribunais teriam menos, e a ordem pública não teria nada a
temer." Ele disse uma grande e profunda verdade; porque se começa a
perceber a influência moralizadora que o Espiritismo exerce sobre as massas.
Não é um resultado maravilhoso ver homens, sob o império desta crença,
renunciarem à embriaguez, aos seus hábitos de deboche, aos excessos degradantes
e ao suicídio; homens violentos se tornarem organizados, dóceis, pacíficos e
bons pais de família; homens que blasfemavam o nome de Deus, orar com fervor, e
se aproximar piedosamente dos altares? E são esses homens que expulsais da
Igreja! Ah! pedi a Deus que, se reserva ainda à Humanidade dias de prova, haja
muitos Espíritas; porque estes aprenderam a perdoar a seus inimigos,
considerando como primeiro dever do cristão lhes estender a mão no momento do
perigo, em lugar de lhes meter o pé sobre a garganta.
Um livreiro de Charente
nos escreveu o que se segue:
"Não tenho medo de
ostentar abertamente minhas opiniões espíritas; deixei de lado mesquinharias
mundanas, sem me preocupar se, o que faço, não prejudicaria o meu comércio.
Estava, entretanto, longe de esperar o que me ocorreu. Se o mal tivesse se
detido em pequenos tormentos, ele não foi grande; mas, ah! graças àqueles que
compreendem pouco a religião, tornei-me a ovelha negra da tropa, a peste do
lugar; fui mostrado como precursor do Anticristo. Empregaram-se todas as
influências, a calúnia mesmo, para me fazer cair, para afastar meus clientes,
para me arruinar em uma palavra. Ah! os Espíritos nos falam de perseguições, de
mártires do Espiritismo; disso me orgulho, mas, certamente, sou do número das
vítimas; minha família disso sofre, é verdade; mas tenho para minha consolação
de ter uma mulher que partilha minhas ideias espíritas. Tarda-me para que meus
filhos estejam na idade de compreender essa bela doutrina; prendo-me em
esclarecê-los em nossas queridas crenças. Que Deus me conserve a possibilidade
- o que quer que se faça para me tirá-la - de instruí-los e de prepará-los para
lutarem a seu turno, se for preciso. Os fatos que narrais, em vossa Revista no
mês de maio, têm uma analogia chocante com o que me aconteceu. Como o autor da
carta, fui expulso impiedosamente do tribunal da penitência; meu cura queria,
antes de tudo, fazer com que eu renunciasse às minhas ideias espíritas; resulta
de sua imprudência que não me verá mais em seus ofícios; se fiz mal, deixo
disso a responsabilidade ao seu autor."
Extraímos as passagens
seguintes de uma carta que nos foi dirigida de uma aldeia do Vosges. Embora
estejamos autorizados a não calar nem o nome do autor, nem o da localidade, nós
não o fazemos por motivos de conveniência, que se apreciará; mas temos a carta
nas mãos para dela fazer uso que creiamos útil. Ocorre o mesmo para todos os
fatos que adiantamos, e que, segundo a sua maior ou menor importância,
figurarão, mais tarde, na história do estabelecimento do Espiritismo.
"Não sou bastante
versado na literatura para tratar dignamente o assunto que empreendo; todavia,
tentarei me fazer compreender, na condição de que suprireis a falta de meu
estilo e de minha redação, porque há vários meses queimo pelo desejo de me unir
a vós por correspondência, a estando-o já pelos sentimentos desde que meu filho
me enviou os preciosos livros contendo a instrução da Doutrina Espírita e a dos
médiuns. Eu chegava do campo ao cair da noite; notei esses livros que o correio
me trouxera; apressava-me em jantar e me deitar, tendo a vela acesa junto de
meu leito, pensando ler até o momento em que o sono viesse me fechar os olhos,
mas li toda a noite com uma tal avidez que não senti o menor desejo de
dormir."
Segue a enumeração das
causas que tinham levado nele a incredulidade religiosa absoluta, e que
passamos por respeito humano.
'Todas essas considerações
me passam diariamente no espírito; o desgosto se apoderou de mim; tinha caído
num estado de ceticismo o mais endurecido; depois em minha triste solidão de
tédio e de desespero, cria-me inútil à sociedade, tinha decidido pôr fim em
meus dias tão infelizes pelo suicídio.
"Ah! senhor, não sei
se alguém poderá jamais se fazer uma ideia
do efeito que produziu sobre mim a leitura de O Livro dos Espíritos; a
confiança renasceu, o amor de Deus se apoderou de meu coração e eu sentia como
um bálsamo divino se derramando sobre todo o meu ser. Ah! dizia-me, toda a
minha vida procurei a verdade e a justiça de Deus e não encontrei senão o abuso
e a mentira; e agora, sobre os meus velhos dias, tenho, pois, a felicidade de
encontrar essa verdade tão desejada. Que mudança em minha situação que, de tão
triste, tornou-se tão doce! Agora me encontro continuamente em presença de Deus
e de seus Espíritos bem-aventurados, meu criador, protetores amigos fiéis;
creio que as mais belas expressões dos poetas seriam insuficientes para pintar
uma situação tão agradável; quando meu fraco peito pode permiti-lo, encontro
minha distração no canto dos hinos e dos cânticos que creio ser-lhe o mais
agradável; enfim, sou feliz graças ao Espiritismo. Recentemente escrevi ao meu
filho que me enviando esses livros, me havia tornado mais feliz do que se me
tivesse posto na cabeça a fortuna mais brilhante."
Segue o relato detalhado
de tentativas de mediunidade feitas na aldeia entre vários adeptos e os
resultados obtidos; entre eles se encontravam vários médiuns, dos quais um
parecia bastante notável. Chamaram parentes e amigos, que vieram lhes dar
provas incontestáveis de identidade, e Espíritos superiores que lhes deram
excelentes conselhos.
'Todas essas evocações
foram narradas aos ouvidos do Sr, cura, por compadres e comadres, que as
desnaturaram em grande parte. A dezoito de maio último, o Sr. cura, dando o
catecismo aos seus alunos da primeira comunhão, vomitou mil injúrias contra a
casa C... (um dos principais adeptos) e contra mim; depois ele dizia ao filho
C...: "Tu, eu não te quero mais, mas em dois anos serás bastante forte
para ganhar tua vida; aconselho-te a deixar teus pais, eles não são capazes de
te dar bons conselhos." Eis um bom catecismo! Na véspera, ele subiu
propositadamente ao púlpito para recomeçar o discurso que tivera com seus
alunos um instante antes, dizendo com uma grande volubilidade que nada
conhecemos do inferno, que não arriscamos nada para nos entregar ao roubo e à
rapina para nos enriquecer às custas de outrem; que era nos dar aos sortilégios
e às superstições da Idade Média, e mil outras invectivas.
"A esse propósito,
escrevi uma carta ao Sr. procurador imperial de M...; mas antes de enviá-la
quis consultar o Espírito de São Vicente de Paulo na nossa próxima reunião.
Esse bom Espírito fez o médium escrever o que se segue: "Lembrai-vos
destas palavras do Cristo: "Perdoai-lhes, porque não sabem o que
fazem." Depois do que, queimei minha carta.
A fama dessa doutrina se
difunde em todas as aldeias vizinhas; várias me pediram e fazem pedir meus
livros, mas não me restam mais; todos aqueles que compreendem um pouco a
leitura querem lê-los e os passam de mão em mão."
"Depois de ter lido O
Livro dos Espíritos e o dos Médiuns, meu primeiro cuidado foi tentar se podia
ser médium. Durante oito dias nada tendo obtido, escrevi ao meu filho minha
falta de sucesso. Como morava em sua casa um magnetizador, este lhe propôs me
escrever uma carta que ele magnetizaria, e que com isso eu podia fazer
infalivelmente a evocação de minha defunta. O pobre magnetizador não pensava
que me proporcionava as varas para fazer chicotear. Com isso tornei-me médium
auditivo; coloquei-me de novo em posição de escrever e logo me foi dito ao
ouvido: "Procuram enganar teu filho." Durante três dias consecutivos,
com uma força progressiva, essa advertência vinha-me ao ouvido e tirava-me a
atenção que devia pôr naquilo que fazia. Disso escrevi a meu filho para
adverti-lo de desconfiar desse homem. Pelo retorno do correio, respondeu-me
para me censurar as dúvidas que tinha contra esse homem, a quem dava toda a sua
confiança. Poucos dias depois recebi dele uma nova carta, que mudava de
linguagem, dizendo que tinha colocado à porta esse infeliz tratante que,
vestindo-se por fora de um homem honesto, servia-se dessa pretensa qualidade
para melhor prender suas vítimas. Colocando-o à porta, mostrou-lhe minha carta,
que, a cem léguas de distância, o tinha pintado tão bem."
Esta carta não tem
necessidade de comentários; vê-se que o discurso do Sr. cura produziu seu
efeito no meio desses camponeses, como alhures. Se foi o diabo que tomou, nessa
circunstância, o nome de São Vicente de Paulo, o Sr. cura deve com isso estar
satisfeito! Temos razão em dizer que os próprios adversários fazem a propaganda
e servem à nossa causa sem o querer? Dizemos, no entanto, que fato semelhante
são antes exceções do que a regra; pelo menos gostamos de assim pensar;
conhecemos muitos honrados eclesiásticos que deploram essas coisas como
impolíticas e imprudentes. Se nos assinalam alguns atos lamentáveis, nos
assinalam também um bom número deles de um caráter verdadeiramente evangélico.
Um sacerdote dizia a uma de suas penitentes que o consultava sobre o
Espiritismo: "Nada chega sem a permissão de Deus; portanto, uma vez que
essas coisas ocorrem, é que não podem ser senão por sua vontade." - Um
moribundo fez chamar um sacerdote e lhe disse: "Meu pai, há cinquenta anos
que não frequentava mais as igrejas e que já havia esquecido Deus; foi o
Espiritismo que me conduziu de novo a ele e que é a causa que me fez vos chamar
antes de morrer; dar-me-eis a absolvição? -- Meu filho, responde o sacerdote,
os objetivos de Deus são impenetráveis; rendei-lhe graça por vos ter enviado
essa tábua de salvação: morrei em paz." - Poderíamos citar cem exemplos
semelhantes.
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